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"Esquadrão Suicida" não é propriamente ruim - é só bobo

Alexandre Matias

06/08/2016 09h58

Fui temendo o pior, claro. Afinal, se o filme que uniu os dois maiores super-heróis da história dos quadrinhos já figura na minha lista pessoal de piores filmes que já vi na vida, o que podia esperar de um filme cujo mote era a reunião de supervilões numa missão para o salvar o planeta? A ousadia da DC de fazer um filme do ponto de vista dos bandidos me parecia errada justamente por querer transformá-los em heróis. O mesmo tipo de erro que impulsionou seu filme anterior para o abismo: por que os dois maiores heróis precisam estar juntos lutando um contra o outro?

Mas sempre há o benefício da dúvida. Ainda mais nesse século em que aprendemos a ter vilões como heróis nas grandes séries de TV recentes: Tony Soprano é um gângster assassino e psicopata, Walter White é um traficante em ascensão que descobre que gosta de matar pessoas, Don Draper é um publicitário escroto, machista e falso, Frank Underwood é o Eduardo Cunha que conseguiu ser presidente. E se misturamos esse nosso encanto pela maldade com a polarização extremista alimentada pelo Facebook desde o início da década ao péssimo 2016 de Trump, Brexit e Temer que se desenrola até agora, talvez Esquadrão Suicida seja o filme que precisamos ver – uma sessão de tortura audiovisual que nos ajude a pensar como é que chegamos aqui.

E as primeiras impressões que começaram a aparecer sobre o filme deixavam as coisas ainda piores, com resenhas de veículos que gostaram originalmente de Batman vs. Superman (como podem? Cada um cada um) descendo o sarrafo no novo filme da DC. E mesmo as críticas positivas não eram convincentes, sempre pareciam ter um ou outro pé atrás com o resultado final.

E assim entrei na sessão: temendo o pior. E o pior não veio.

Esquadrão Suicida não é um filme propriamente ruim. Em nenhum momento tive vontade de sair da sala de cinema ou coloquei as mãos sobre o rosto incrédulo com a decepção, como dezenas (DEZENAS) de vezes durante Batman vs. Superman (e desde a PRIMEIRA cena). Os piores sentimentos que surgiram durante a sessão foram o tédio – algo comum nos filmes de ação genéricos de hoje em dia – e uma estranha pena. Mas o filme até que se segura.

Pra começar, há cinco atores convincentes: Will Smith sendo Will Smith, Joel Kinnaman se esforçando pra não rir de seu personagem, o surpreendente Diablo de Jay Hernandez e tanto o Coringa de Jared Leto quanto a Harley Quinn de Margot Robbie (que não é uma grata surpresa pois já vimos tudo nos trailers), que funcionam bem. Sò isso já dá uma vantagem de cinco atores sobre Batman vs. Superman, um filme que nos fez rir de uma atuação de Jeremy Irons.

O Coringa de Jared Leto se beneficia de sua ausência – ele é um coadjuvante de luxo da história principal e sua trama paralela o ilumina por pouquíssimos minutos num filme com mais de duas horas. Sua versão histriônica nu-metal do Coringa, portanto, aparece quase sutil, uma característica que sequer imaginávamos quando ele foi nos apresentado com aquelas tatuagens-onomatopeias. Talvez nos enjoasse se aparecesse mais vezes durante o filme, algo que vamos descobrir em algum dos próximos filmes do Batman.

A Harley Quinn de Margot Robbie é exatamente o que você espera dela – e ela pede um filme com mais destaque, que de preferência não seja dirigido por David Ayer. O diretor de Esquadrão Suicida a utiliza sempre como um contraponto cômico para cenas tensas, o que funciona no início mas depois vira uma fórmula gasta. E a atriz parece ter se esforçado para tornar seu personagem mais do que apenas "engraçadinho", embora seu relacionamento com o Coringa inspire vários momentos tediosos do filme (quase nunca em cenas de ação).

O resto do elenco é mais ou menos – e mais pra menos. A ótima Viola Davis oscila entre o que sua personagem deveria ser (durona e fria) e uma professora de jardim de infância desesperada com a bagunça na sala de aula. A Katana de Karen Fukuhara e o Capitão Bumerangue de Jai Courtney são meros figurantes com algumas falas, mas melhores que o Crocodilo de Adewale Akinnuoye-Agbaje, que se resume grunhir sob uma maquiagem pesadaça. E a atuação da vilã Magia, vivida por Cara Delevinge, é o ponto baixo de todo o filme. Ela reencarna uma versão atual da demoníaca personagem de Sigourney Weaver no Caça-Fantasmas original como a sensualidade de uma parede, me fazendo ter saudade do monstro de estrume que torna-se o vilão principal de Batman vs. Superman. Sua atuação é digna deste filme, não de Esquadrão Suicida.

A história você já sabe: "Precisamos juntar vilões para derrotar um vilão maior!", "mas quem irá controlá-los?". Só que no meio dela nos simpatizamos pelos vilões e eles deixam de ser simplesmente maus. Tornam-se apenas um bando de malucos, uma espécie de o Esquadrão Classe A que 2016 merece. O filme é só um painel de novos personagens, apresentado-os um por um, sem uma história de verdade, sem um roteiro, sem algo mais profundo do que diálogos espertinhos. Isso é deixado claro desde o início, principalmente pela forma publicitária com que decide apresentar os vilões. É um clipe de duas horas – com muita música, diga-se.

No fim, Esquadrão Suicida parece ser uma versão dos Guardiões da Galáxia vivida pelo Slipknot (nome, aliás, de um dos supervilões secundários). É intenso, é barulhento, faz rir e passar raiva como uma criança birrenta – porque no fundo, ele é só isso: um filme bobo. Tem bons momentos (nenhum deles com o Ben Affleck), mas não vale o preço do ingresso no cinema – nem no pay per view. Espera passar na TV, que é o lugar certo pra um filme desses – faz o tempo passar, dá pra ir no banheiro ou para a geladeira sem precisar apertar o pause ou dormir no meio sem culpa.

Ou seja, é melhor que Batman vs. Superman.

O filme pode até ser bom para a DC por ter apresentado personagens que rendem filmes próprios, mas transfere para o filme da Mulher Maravilha toda a responsabilidade sobre a continuidade de seu universo.

Ainda bem que eu já tinha visto um bom filme de ação nessa semana, pois pude ver o novo Jornada nas Estrelas em sessão para a imprensa. Com certeza compensou o ataque de bobeira que é Esquadrão Suicida.

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Sobre o Autor

Alexandre Matias cobre cultura, comportamento e tecnologia há mais de duas décadas e sua produção está centralizada no site Trabalho Sujo (www.trabalhosujo.com.br), desde 1995 (@trabalhosujo nas rede sociais). É curador de música do Centro Cultural São Paulo e do Centro da Terra, do ciclo de debates Spotify Talks, colunista da revista Caros Amigos, e produtor da festa Noites Trabalho Sujo.

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