"Exile on Main St.", clássico disco dos Rolling Stones, vai virar filme
Alexandre Matias
15/06/2016 13h59
Uma tendência parece estar em andamento à medida em que o anúncio de um filme sobre o disco clássico dos Rolling Stones, Exile on Main St., de 1972, foi confirmado pelo site Deadline. Depois de biografias sobre artistas pop e documentários sobre estes mesmos artistas, está chegando a hora de começar a mergulhar em discos através de filmes. Em vez de tentar documentar toda a história de um determinado popstar, o foco em um disco pode trazer referências do passado e do futuro do artista bem como do disco em questão, além de reforçar os chamados clássicos para uma geração que cresce com a música descolada de suportes físicos, mais afeita a playlists do que a discos.
Exile on Main St. não é o melhor exemplo do comportamento dos Stones como banda e sim um capítulo à parte – e por isso mesmo um disco único. Diferente de discos como os primeiros álbuns ainda nos anos 60, em que o atrito entre o fundador da banda Brian Jones e a dupla em formação Mick Jagger e Keith Richards davam toda a energia que a banda precisava, ou dos discos dos anos 70 em diante, em que a personalidade do vocalista e seu tino de negócios guiavam o rumo da banda, Exile on Main St. é um disco de Keith Richards. Por isso mesmo, o disco mais rústico e pitoresco dos Stones – ao mesmo tempo em que toca na essência do rock'n'roll, do conjunto, ainda que as músicas não sejam as mais conhecidas nem os riffs tão memoráveis quanto os de seus hinos de levantar estádio. Mas é uma coleção de canções que refletem o aspecto mais mundano dos Stones, quando o grupo agia como um grupo de nômades, uma trupe de bandoleiros, piratas elétricos atravessando oceanos em jatinhos particulares.
O único disco duplo dos Rolling Stones, ele foi gravado no sul da França, em uma villa em que Keith Richards mudou-se depois que a máquina de fazer dinheiro do grupo começou a ter problemas com o imposto de renda inglês. Fugindo da Rainha, os Stones se instalaram na França, Jagger em Paris e os outros integrantes no litoral sul do país. A casa de Keith Richards, no entanto, servia de base para o caminhão-estúdio da banda e em pouco tempo ele havia montado um estúdio improvisado no porão de sua pequena mansão, além de receber celebridades barra pesada como o poeta William Burroghs, o guitarrista Gram Parson e o escritor Terry Southern. Aos poucos os outros Stones entraram numa festa incessante na casa de Richards, que inevitavelmente descia para o estúdio para jam sessions de toda a natureza, todas as noites, à noite toda. Durante este processo, Mick Jagger e o baixista Bill Wyman estiveram avessos ao funcionamento da banda, que abria sua panelinha para muita gente, e aos poucos o caldo instrumental de um novo grupo ia surgindo sob a batuta elétrica de Keith. Durante este mesmo processo Keith Richards começou a usar heroína pra valer.
O disco foi gravado com a ajuda do produtor Jimmy Miller – que às vezes assumia a bateria – e do saxofonista Bobby Keys, além da presença constante de Richards, do segundo guitarrista Mick Taylor e do baterista Charlie Watts. A maioria dos baixos do disco foi gravada por Keith ou Taylor e os vocais foram gravados sobre músicas que vinham de jam sessions que originalmente não tinham vocais. Por muito tempo Mick Jagger renegava o disco e considerava que seus vocais eram apenas rascunhos do que deveriam ter sido. O disco foi completo por Jagger em Los Angeles, quando o grupo gravou as músicas mais elétricas da coleção e o vocalista chamou Dr. John e Billy Preston para acrescentar teclados sobre algumas faixas. Os novos músicos trouxeram as referências gospel e soul do disco ainda mais à tona, incluindo a gravação de corais.
Essa é a história que vai virar filme através do diretor Andy Goddard, que tem episódios de Downton Abbey da emissora inglesa ITV e do Demolidor da Netflix no currículo, e será inspirada no livro Exile on Main Street: A Season in Hell with the Rolling Stones, em que o jornalista Robert Greenfield revê especificamente este período da carreira do grupo. Não há nenhuma informação sobre data de lançamento ou elenco, mas a confirmação da produção continua um processo aberto por Love & Mercy – ou, como traduzido no Brasil, The Beach Boys: Uma História de Sucesso -, de 2014, em que a biografia de Brian Wilson, líder dos Beach Boys, é visitada em dois momentos cruciais de sua vida.
Sobre o Autor
Alexandre Matias cobre cultura, comportamento e tecnologia há mais de duas décadas e sua produção está centralizada no site Trabalho Sujo (www.trabalhosujo.com.br), desde 1995 (@trabalhosujo nas rede sociais). É curador de música do Centro Cultural São Paulo e do Centro da Terra, do ciclo de debates Spotify Talks, colunista da revista Caros Amigos, e produtor da festa Noites Trabalho Sujo.
Sobre o Blog
A cultura do século 21 é muito mais ampla que a cultura pop, a vida digital ou o mercado de massas. Inclui comportamento, hypes, ciência, nostalgia e tecnologia traduzidos diariamente em livros, discos, sites, revistas, blogs, HQs, séries, filmes e programas de TV. Um lugar para discussões aprofundadas, paralelos entre diferentes áreas e velhos assuntos à tona, tudo ao mesmo tempo.