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Ivete Sangalo ainda está longe do pop internacional

Alexandre Matias

16/05/2015 09h01

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Ivete Sangalo se acha. É natural, afinal ela talvez seja a principal popstar do Brasil hoje, título que carrega por uma conjunção de fatores que misturam hits populares, personalidade reconhecível, movimentação de dinheiro e escala nacional. Mas há uma distância enorme entre ser um grande nome da música pop no Brasil e ser alguém no pop mundial. E a baiana subiu no palco do Rock in Rio Las Vegas nesta sexta-feira achando que era a próxima Jennifer Lopez. Menos, Ivete, menos.

Foi esta soberba que deixou seu show numa espécie de encruzilhada artística. Não bastasse o tombo que sofreu logo ao entrar no palco, ela imaginou que o público não-brasileiro fosse assistir ao seu show para querer saber quem era essa cantora brasileira que tocava no palco principal, ao contrário de outros artistas nacionais que se apresentaram nos palquinhos terciários da vilinha criada pelo evento.

Ela até arriscou falar em inglês e pediu constrangedoramente para que o público chamasse seu prenome acompanhado de "number one". Com seu característico humor despachado, a baiana disse que não ligava der ser "number two", embora não desse para entender qual era o topo do ranking que ela almejava: número 1 no Rock in Rio? Faz-me rir. Artista brasileira número 1 no exterior? Pouco provável. Se fosse apenas o número 1 do Brasil, não precisava ser dito em inglês. Ela parecia fazer querer que seus fãs dissessem para os poucos estrangeiros que a assistiam quem era ela em seu país.

Ainda teve a pachorra de se referir a Taylor Swift apenas como "Taylor", como se fosse íntima. Não adianta dizer que era ironia – ela realmente acha que está a poucos passos do status da autora do hit "Shake it Off". E quando ela tentou fazer que os nativos norte-americanos e turistas de outros países que estavam assistindo ao seu show cantassem trechos de suas músicas em português, provocou um raro momento de quase silêncio no festival.

Nossos conterrâneos não ligavam. Cantavam todas as músicas de Ivete e as versões que ela trouxe para o show, entre músicas brasileiras (hits da axé music como "Nossa Gente (Avisa Lá)" e "Faraó", ambas do Olodum) e estrangeiras ("Master Blaster" de Stevie Wonder e "Could You Be Love?" de Bob Marley).

Aliás, foi justamente nesse pequeno interlúdio reggae (intercalado pelas próprias músicas "Flor do Reggae" e "Amor Que Não Sai") que Ivete quase se encontrou, achando um meio termo entre o pop global e a música da Bahia. Se ela escolhesse – ou afiasse – uma terceira via entre estas duas facetas poderia até achar um rumo para sua carreira no exterior. Mas Ivete é o típico exemplo de um artista brasileiro que apenas atrai outros brasileiros para sua apresentação. Cabe a ela mesma mudar esse jogo – se o que ela almeja é o reconhecimento internacional.

Sobre o Autor

Alexandre Matias cobre cultura, comportamento e tecnologia há mais de duas décadas e sua produção está centralizada no site Trabalho Sujo (www.trabalhosujo.com.br), desde 1995 (@trabalhosujo nas rede sociais). É curador de música do Centro Cultural São Paulo e do Centro da Terra, do ciclo de debates Spotify Talks, colunista da revista Caros Amigos, e produtor da festa Noites Trabalho Sujo.

Sobre o Blog

A cultura do século 21 é muito mais ampla que a cultura pop, a vida digital ou o mercado de massas. Inclui comportamento, hypes, ciência, nostalgia e tecnologia traduzidos diariamente em livros, discos, sites, revistas, blogs, HQs, séries, filmes e programas de TV. Um lugar para discussões aprofundadas, paralelos entre diferentes áreas e velhos assuntos à tona, tudo ao mesmo tempo.

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