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E se o final de "Mad Men" tirar Don Draper do mundo da ficção?

Alexandre Matias

15/05/2015 13h01

Mad Men, uma das principais séries desta nova era de ouro da televisão inaugurada com a obrigatória Sopranos na virada do século, está prestes a chegar ao final. Seu último episódio vai ao ar neste domingo, nos EUA, e será retransmitido pela HBO brasileira logo em seguida, na segunda-feira. A série criada por Matthew Weiner revelou uma década de 60 distante do idealismo da contracultura norte-americana que estamos acostumados a nos referir, mostrando como, enquanto beats e hippies coloriam e expandiam o pós-guerra, a publicidade começa a distorcer o mundo rumo a esse shopping center que habitamos hoje.

Mas mais do que uma série de época sobre os EUA de 50 anos atrás, Mad Men é uma obra existencialista que parte do pressuposto da reinvenção de identidade que é a base do sonho americano. Seu protagonista, claro, é o já imortal Don Draper vivido por Jon Hamm, um canalha alcoólatra machista e bon vivant que, metido num terno e gravata e com cabelo engomado, encarna o macho alfa perfeito do século passado. Todos seus defeitos são ofuscados por sua aura magnânima, uma presença magnética que faz colegas orgulhosos, inimigos invejosos e mulheres se apaixonar.

Mas já sabemos que o verdadeiro Don Draper, para quem acompanha a série (e se você não acompanha pare de ler este texto agora, pois lá vêm os spoilers), morreu antes do fim dos anos 50. Foi uma identidade roubada por Richard "Dick" Whitman, um garoto do meio oeste norte-americano para recomeçar a vida após a Guerra da Coreia. Com um novo nome, ele começa sua reinvenção em Nova York no mundo da publicidade, mas à medida em que os anos 60 – e a série – vão chegando ao fim, ele começa a ver toda a personalidade que construiu começar a se esvair: primeiro os casamentos e os filhos, depois o lar e finalmente a agência. E será que, no último episódio, que vai ao ar no próximo domingo, veremos mais uma reinvenção do personagem?

É o que apostou, há dois anos, uma fã do seriado que cogita que a série pode conectar o mundo da ficção do seriado com um dos crimes perfeitos mais impressionantes da história americana, que aconteceu na vida real.

Em 1971, um sujeito alinhado e bonitão, cigarro numa mão e bourbon na outra, abordou uma aeromoça num voo da empresa Northwest Orient. Ele entregou um bilhete à moça que, achando que era apenas um galanteio por escrito, riu e guardou-o no bolso sem o ler. Ao perceber este movimento, o galã sussurrou para a comissária para que ela lesse o conteúdo do bilhete: "Tenho uma bomba", concluiu.

No bilhete, o galante terrorista exigia uma mala com 20 mil dólares em espécie, que sabia que estava a bordo, e um paraquedas. E no meio do voo, ele simplesmente pediu que abrissem a porta do avião e atirou-se para o desconhecido, sem que soubéssemos até hoje suas motivações e seu paradeiro. O incidente é discutido até hoje e tornou-se objeto de um best-seller, o livro Skyfall, de Geoffrey Grey, publicado em 2012.

O nome do criminoso? D.B. Cooper.

Isso mesmo: quase o nome do dono da agência em que Don Draper trabalha por toda a série, Bert Cooper, que morre na primeira metade da última temporada e começa a assombrar Draper em forma de alucinação.

D. B. Cooper.

Don Bert Cooper.

Isso vai de encontro à maioria das teorias sobre o fim de Mad Men de uma forma espetacular. A mais evidente delas parece estar explícita desde sua abertura, quando vimos uma silhueta cair de um arranha-céus em meio a várias referências ao mundo da publicidade. Don Draper veria que sua vida não faz sentido e se atiraria de um prédio em seu último grande gesto. As pistas para este final estão espalhadas por toda a série: Don Draper não gosta de voar, o fosso do elevador que se abre para ele na quinta temporada e um comentário de sua ex-mulher Megan na primeira metade da temporada atual, quando ela dizia que ele "não pode pular da sacada e sair voando para o trabalho como o Super-Homem".

Outra versão para o fim de Mad Men é que esse suicídio não seria literal e sim metafórico. Da mesma forma que Don Draper era uma identidade já existente e que Richard Whitman assumiu para si, uma nova identidade pode estar à espera de Whitman /Draper ao final do seriado.

Junte isso à história de D.B. Cooper e temos não apenas um final surpreendente como também as explicações para o gesto insano do criminoso da vida real que ninguém sabe quem é.

E você, cogita algum final específico para o seriado?

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Sobre o Autor

Alexandre Matias cobre cultura, comportamento e tecnologia há mais de duas décadas e sua produção está centralizada no site Trabalho Sujo (www.trabalhosujo.com.br), desde 1995 (@trabalhosujo nas rede sociais). É curador de música do Centro Cultural São Paulo e do Centro da Terra, do ciclo de debates Spotify Talks, colunista da revista Caros Amigos, e produtor da festa Noites Trabalho Sujo.

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A cultura do século 21 é muito mais ampla que a cultura pop, a vida digital ou o mercado de massas. Inclui comportamento, hypes, ciência, nostalgia e tecnologia traduzidos diariamente em livros, discos, sites, revistas, blogs, HQs, séries, filmes e programas de TV. Um lugar para discussões aprofundadas, paralelos entre diferentes áreas e velhos assuntos à tona, tudo ao mesmo tempo.

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