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Vamos discutir sobre "O Despertar da Força"

Alexandre Matias

22/12/2015 20h34

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A essa altura do campeonato presumo que quem queria assistir ao Episódio VII da Saga Skywalker já tenha assistido – se não, não consigo imaginar a frustração e a tensão. O Despertar da Força é melhor do que esperávamos em vários sentidos, mas, num específico ele é apenas a armação para uma história que só começou a ser contada. A última cena do filme é o inicio de uma tela em branco que só começará a ser pintada no Episódio VIII. E uma vez que já temos uma audiência considerável para que possamos discutir o filme contando com os spoilers, peço licença para quem não assistiu ao novo filme ir procurar outro texto para ler e não correr o risco de ter suas emoções abaladas por causa de algum spoiler lido sem querer. Por isso, antes de começar, alguns gifs:

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Se você não assistiu ao Despertar da Força não deveria estar lendo essa frase. Cai fora.

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Pronto. Ao chegar aqui pressuponho que esteja bem avisado de que falarei de detalhes do filme e de cenas cruciais para quem não assistiu ao novo episódio. Primeiro resolvi dividir em tópicos, por personagens, em que comento o que achei de cada personagem, jogo algumas teorias sobre ele que estão circulando por aí (a maioria criada por fãs, lógico), e no final tento amarrar tudo sobre minhas expectativas em relação ao que esperar até o próximo filme. Uma espera que está só começando…

Kylo Ren

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Antes de falar do grande vilão do filme, devo comentar que todo o lado sombrio da Força nesse filme é bem raso se compararmos com a trilogia original. Se J.J. Abrams consegue capturar todo o encanto dos velhos personagens ao nos apresentar os novos, o mesmo não acontece quando ele nos mostra os vilões. Nenhum deles chega aos pés da presença magistral de Darth Vader, um dos grandes personagens da história do cinema. Vader inspirava pavor e medo, mas ao mesmo tempo nos deixava pasmos com seu poder e peso dramático. Ele provocava uma sensação de que valia à pena ir para o lado escuro da Força, deixar as emoções para trás e se tornar um vilão onipotente. Kylo não chega nem aos pés disso. Parece só um menino chorão, mimado, que dá pitis quando é contrariado. O fato de ele tirar o capacete o tempo todo – uma vez para o próprio pai (justificável), mas outra para uma prisioneira… Pra quê? – também não ajuda sua hostilidade a ser temida e ele só vira o vilão de fato porque mata o próprio pai. Tudo bem que ele deu a ordem para a destruição do sistema planetário da República, mas isso parece ser mais uma vontade do oficial Hux (que disputa poder com Kylo) do que dele. Ele torna-se o grande vilão por matar um personagem querido, mas mesmo no momento desta morte ele não parece convencer…
Teoria: Ele não bandeou de vez para o lado escuro e pode virar a casaca no Episódio VIII. Por isso que vimos seu rosto, para que ele pudesse ser humanizado de forma mais convincente a partir do próximo filme. Ou talvez ele já esteja no lado da luz mas fingindo estar do lado das trevas para concluir o que seu avô deveria ter feito – se infiltrar no lado negro para matar o Snoke!

Supremo Líder Snoke

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Não sei se é o holograma gigante ou as rugas do rosto que se comprimem demais em close, mas o mentor do vilão da série, mesmo sendo interpretado pelo mestre das feições digitais Andy Serkins, não convence pelos motivos opostos à falta de credulidade em relação a Kylo. Se o filho de Han Solo exagera no tom, Snoke falha e soa como um vilão de desenho animado, entre o Munn-Rah dos Thundercats e o Vingador da Caverna do Dragão. É um personagem quase sem profundidade, vilão pela pura vilanice, e sua construção em computação gráfica reforce esse aspecto caricato da maldade. Mas é claro que isso pode ser um mero disfarce. Mas afinal, quem é Snoke?
Teoria: Como o personagem tem poucas referências, o que não faltam são teorias: Snoke seria o infame Darth Plagueis, citado na nova trilogia, que teria sido o mentor do Imperador Palpatine. Ou talvez o próprio Imperador Palpatine, renascido em uma nova forma. A cicatriz em seu rosto poderia ser relacionada ao passado – e talvez à reclusão – de Luke Skywalker. E a teoria mais doida é que a cogita que ele seria o mercenário Bobba Feth, um dos personagens mais clássicos da saga, embora essa hipótese não faça o menor sentido. Além disso há quem cogite que sua não-presença seja um disfarce e sua estatura talvez seja uma truque à la Mágico de Oz – e ele em vez de ser alto e imponente, é baixinho e pitoresco como Yoda ou Maz Kanata.

Leia

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Ela aparece tão pouco para uma personagem tão importante… Como os novatos Snokes e a Capitã Phasma, Leia aparece mais para dizer-se presente do que tem alguma serventia narrativa para esse episódio. Sua única função é a de funcionar como um apoio emocional para o caubói do espaço Han Solo. Sem ela, que sente a morte do pai de seu filho no exato momento em que ela acontece, choraríamos a morte de Solo com os urros de Chewbacca ou os gritos de Finn e Rey. Leia dá uma dimensão maior à dor do sabre que atravessa o mercenário e à sua queda no vazio, sublinhando uma sensação que só o Wookie e nós fãs conseguimos sentir. Mas, num filme tão feminista, reduzir Leia a apenas este papel é errado: Leia é a antiprincesa Disney e gostava de pegar em armas mais do que seguir o protocolo real. Mas como o Episódio VII é a preparação para a história, talvez a principal informação sobre Leia diz respeito ao seu cargo: ela não mais uma nobre, e sim militar. E talvez veremos a General Organa ainda mais decidida nos próximo episódios – ainda mais quando tiver que lidar com seu irmão.
Teoria: Leia poderia ser a mãe de Rey, tornando-a também filha de Han Solo e irmã de Kylo. A paternidade explicaria porque ela pilota tão bem e porque os dois completam as frases um do outro. Mas Leia tem a Força e mesmo que tivesse uma filha retirada de seu convívio muito cedo, conseguiria sentir algo em relação à catadora de lixo, o que não acontece durante o filme.

C3PO e R2D2

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Os personagens onipresentes na saga deram o ar de sua graça muito discretamente. C3PO aparece com um braço vermelho e fala em consertar o tal braço, embora isso não aconteça. Na verdade acredito que isso seja apenas uma brincadeira do diretor, que testou o nível de fanatismo dos espectadores ao brincar com a possibilidade do braço vermelho do androide. Ele apareceu rapidamente em uma cena antes do filme e nas imagens de divulgação seu braço ficava sempre escondido, criando uma expectativa sobre o que teria acontecido. O braço vermelho foi revelado na versão de brinquedo do robô e num comercial de TV e não tem motivo nenhum de aparecer na tela, à exceção de sua cor. O vermelho também é a cor do peixe "red herring" (arenque vermelho), uma expressão que serve para designar algo feito apenas para iludir o espectador. Não há nenhum motivo para que o braço de C3PO fique vermelho, a não ser atiçar nossa expectativa (ou será que há algum paralelo entre o braço vermelho de C3PO e a ombreira vermelha usada por um stormtrooper?). Já R2D2, que foi apresentado hibernando com baixa energia, reacende para completar o mapa e mostrar o caminho para Luke Skywalker.
Teoria: O que teria ligado R2D2? Luke ou Rey? Ou ele estaria programado para ser religado em determinado ponto da história? Quando a nova arma da Primeira Ordem fosse destruída? Pouco provável. Talvez quando Rey sentisse a Força pela primeira vez? Isso faz mais sentido… R2D2 funcionaria não só como o mapa para chegar em Luke, mas também como um alarme para Luke saber quando estavam vindo o procurar.

Poe Dameron

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Um personagem ótimo, que tem um papel parecido com o de Han Solo na trilogia original, contando piadas infames, quebrando o clima com frases de efeito e destruindo inimigos sempre que pilota. Mas, como Phasma, Snoke e Leia, ele é apenas apresentado e, embora suas ações ajudem a história seguir seu curso, não há carga dramática ou envolvimento emocional com o personagem, o que é muito desperdício de ator (o ótimo Oscar Isaac).
Teoria: Há um estranho vácuo de roteiro em relação a Poe. Sua única missão era levar BB8 até Leia, mas quando ele cai em Jakku, ele se perde de Finn e BB8, e depois o reencontramos liderando um ataque contra a Primeira Ordem, que atacava contra Maz Kanata. Depois, ele encontra-se com Finn e disse que simplesmente saiu de Jakku… Sem o robôzinho? Mas essa não era sua única missão? Fora que há quem especule que ele pode ser filho ou ter sido criado por Luke, além poder ser sensível à Força, o que explicaria sua maestria ao pilotar qualquer nave. E há quem diga que ele pode ser seduzido pelo lado negro da Força, caso isso seja verdade…

Phasma

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Outra personagem quase citada no filme, a stormtrooper prateada mal aparece e nas poucas vezes que surge tem um comportamento estranho: primeiro ela disse que iria verificar Finn e o libera pouco antes de ele sequestrar Poe para fugir do Destroyer. Depois, ela simplesmente aceita que Finn a pressione para desligar os escudos da arma da Primeira Ordem.
Teoria: Phasma é uma agente infiltrada que estaria despertando stormtroopers?

Maz Kanata

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Outra personagem mal aproveitada ou só o começo de uma relação? Óbvio que a senhora de mil anos saiu ilesa da destruição de seu castelo e com certeza a veremos pelo menos no próximo episódio – e, por sua idade, é forte candidata a fazer a conexão da trilogia original (citada à exaustão no filme) e a nova trilogia (que sequer é mencionada). Apesar de muitos se revoltarem contra os Episódios I, II e III, é claro que eles irão ser referidos pela saga no futuro. E a simpática Maz tem tudo para ser a ponte entre essas três épocas.
Teoria: Sua idade também a torna contemporânea de Yoda e é bem possível que os dois tenham se conhecido no passado. Mas ela não é uma personagem espiritualizada; embora reconheça a Força, ela vive de interceptar contrabandos e dar refúgio para fugitivos. Seu castelo lembra tanto a cantina do Episódio IV quanto o reduto de Jabba no Episódio VI. O que pode querer indicar que ela não seja tão boazinha quanto parece…

Han Solo

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Embora haja quem sustente a possibilidade do velho Han estar vivo (mesmo tendo caído de um desfiladeiro interminável após ser atravessado por um sabre de luz), é bem mais provável que não vejamos mais Harrison Ford no papel que popularizou sua carreira. Há uma regra quase táctia em relação à morte de personagens em filmes de ação que diz que enquanto não vemos seu cadáver, ele não está morto de fato. Mas acho pouco provável que ele tenha sobrevivido – embora a ideia de "Han Solo vive" agora seja tão perturbadora e ousada quanto "Han Solo morre" há menos de um mês. E será que foi a sensação de sua morte que fez Luke acionar R2D2 à distância?
Teoria: O ponto central sobre a morte de Han Solo, no entanto, não é sua possível sobrevivência e sim o fato de talvez Solo ter cometido suicídio para acelerar os planos do filho. Essa teoria cogita a possibilidade de tudo ter sido um plano de Leia, Han e Kylo para se infiltrar no lado negro e daria muitos contextos diferentes ao emotivo diálogo entre pai e filho na beira do abismo. Vemos os dois segurando o sabre, mas não vemos quem o liga. Caso tenha sido Han Solo, ele se teria se sacrificado para salvar a reputação do filho e dar continuidade a seu plano de matar o Líder Snoke.

Luke Skywalker

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Eis um grande mistério. Por que Luke se isolou? Por que Kylo Ren se rebelou quando estava sendo treinado por Luke? Por que decidiu mostrar onde estava depois de tempos isolados? O que é o primeiro templo Jedi? Ele está feliz por ter encontrado (ou reencontrado?) Rey? A face imóvel de Mark Hamill na última cena é sua maior atuação na história da saga. Ela é ambígua e demonstra decisão e hesitação simultaneamente.
Teoria: Luke é o pai de Rey, treinou-a quando era pequena mas devido ao incidente com Kylo, isolou-a em Jakku aos cuidados de Lor San Tekka (Max Von Sydow, que fala a incrível primeira frase do filme: "Isso irá consertar as coisas") e fugiu. Por quê? Ele percebeu que Rey poderia ceder ao lado negro como seu primo Ben Solo? Percebeu que Rey era inata em uma série de coisas como seu próprio pai Anakin? Ou ele mesmo teria cedido ao lado negro da Força durante o treinamento do futuro Kylo Ren e isolou-se de todos, deixando sua filha em Jakku, para que ela não conhecesse seus poderes antes da hora? Era uma das vontades do ator nos tempos da primeira trilogia, ver Luke cedendo ao mal como seu pai havia cedido. E se lembrarmos que uma das vontades de Harrison Ford era que Han Solo morresse no final de O Retorno de Jedi…

Finn e os stormtroopers

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Que personagem é esse Finn. Ele tem o gás adolescente e o humor atrapalhado dos protagonistas da primeira trilogia, mas tem um quê a mais, um traço de comportamento do século 21 que seria impossível nas encarnações anteriores de Guerra nas Estrelas. Ele equilibra algo entre o bobo e o arrogante, o ingênuo e o malandro que é algo novo na saga. Ele é uma fusão perfeita entre Luke e Han Solo, mas vai além. E, mais importante, ele era um stormtrooper. Mas por que um stormtrooper acordaria?
Teoria: O despertar da Força do título não diz respeito à Rey – ou não apenas a ela. Finn também poderia ter despertado pela Força de alguma forma, afinal é a primeira vez que se tem notícia de um stormtrooper que volta-se contra o sistema. Embora em outra cena dois soldados fujam do piti que Kylo Ren está dando, o que mostra que eles não são meros paus mandados de seus superiores. Creio que esse ponto será mais discutido nos próximos filmes.

Rey

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A grande protagonista do filme, uma das grandes personagens do cinema desta década, a jovem já entrou no imaginário coletivo como um ícone feminista e uma aprendiz de Jedi. Seu encontro com Luke na última cena é a primeira cena da nova fase de Guerra nas Estrelas, não apenas do próprio episódio. A terceira trilogia começa de verdade a partir do Episódio VIII, tudo que vimos no VII é apenas a armação para a história principal, que ainda nem sabemos qual é.
Teoria: Tudo indica que ela é filha de Luke, o que a torna mais propensa a utilizar a Força. Mas o excesso de reclamações a respeito da facilidade que ela tem de pilotar naves, consertar coisas e manusear armas, incluindo o sabre de luz, pode ser deixado pra lá caso ela seja uma Skywalker e que tenha recebido treinamento desde cedo. O flashback que ela tem ao segurar o sabre que pertenceu a Luke pode resumir essa história, ao mostrar que ela foi testemunha do massacre que Kylo Ren protagonizou e que foi deixada em Jakku provavelmente para nunca mais ser resgatada. Mas será que Luke a deixou ali porque viu que ela pode ir para o lado sombrio? A cara que Luke olha para ela não é de felicidade ao reencontro.

Há dezenas de outras perguntas espalhadas pelo filme: qual a relação da Nova República com a Resistência? O que BB8 fala para Rey depois que Leia diz "que a Força esteja com você" para a jovem? Quem são os Cavaleiros Ren? E aqueles rathrats que Han Solo estava transportando? Como Han Solo encontrou sua nave tão facilmente? A Primeira Ordem acabou? Será que eles vão construir de novo uma nave do tamanho de um planeta que é destruída quando se acerta num ponto fraco? Por que Chewbacca foi com a cara de Rey? Ele já a conhecia? Quem recuperou o sabre de luz de Luke e como ele foi parar nas mãos de Maz?

Há inúmeras teorias possíveis sobre o que podemos ver daqui a 17 meses, quando o Episódio VIII chegará às telas de cinema. Mas há um elemento na equação que estamos esquecendo de levar em conta: J.J. Abrams. A quantidade de dicas, easter eggs e sugestões que ele deve ter espalhado por esse filme deve equivaler aos desdobramentos impossíveis de temporadas inteiras de Lost. Se depois de assistido por algumas vezes os fãs já estão criando histórias, hipóteses e teorias sem parar, imagine quando puderem dar pause em alguns momentos, dar zoom em algumas cenas. Deve haver mensagens secretas em idiomas desconhecidos, textos e subtextos enterrados atrás de cenas que julgamos triviais, personagens que podem ser aprofundados a partir de uma simples referência que muda todo o ponto de vista. Então qualquer teoria criada até agora, por melhor que seja, é pouco. Vamos passar quase dois anos especulando sobre o que pode acontecer no próximo filme enquanto eles vão nos atiçando com o subtítulo, com o teaser, o trailer, o pôster, as primeiras fotos de divulgação, os novos atores… tudo de novo.

Que época para se viver!

Sobre o Autor

Alexandre Matias cobre cultura, comportamento e tecnologia há mais de duas décadas e sua produção está centralizada no site Trabalho Sujo (www.trabalhosujo.com.br), desde 1995 (@trabalhosujo nas rede sociais). É curador de música do Centro Cultural São Paulo e do Centro da Terra, do ciclo de debates Spotify Talks, colunista da revista Caros Amigos, e produtor da festa Noites Trabalho Sujo.

Sobre o Blog

A cultura do século 21 é muito mais ampla que a cultura pop, a vida digital ou o mercado de massas. Inclui comportamento, hypes, ciência, nostalgia e tecnologia traduzidos diariamente em livros, discos, sites, revistas, blogs, HQs, séries, filmes e programas de TV. Um lugar para discussões aprofundadas, paralelos entre diferentes áreas e velhos assuntos à tona, tudo ao mesmo tempo.

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